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sexta-feira, 31 de outubro de 2014

O zero como elemento mediador da Educação

Joaquim Luiz Nogueira

O pensador Kant, escreveu em seu livro “Critica da razão pura”  que a educação necessitava de três coisas: exercício de abstração, depois da impressão e por fim da experiência. Segundo Kant, “todo o nosso conhecimento começa com a experiência”.
No entanto, atualmente, algumas políticas educacionais resolveram  que a educação escolar e suas práticas  poderiam ser melhorada sem ouvir a experiência daqueles que trabalham nela e mobilizaram um exercito de pessoas, que por estarem distante da educação, vomitam discursos de pureza, que de acordo com Kant, seria como alguém que “solapou os fundamentos de sua casa: ele podia saber a priori  que a casa desmoronar-se ia, quer dizer, não precisava esperar pela experiência de seu desmoronamento efetivo”.
Ainda segundo Kant. “Cada mudança tem sua causa, pois mudança é um conceito que só pode ser tirado da experiência” E para compreender um pouco mais sobre os defensores da pureza que se encontram desde as instituições financeiras internacionais até o congresso nacional e nas assembleias estaduais, vamos ver as ideias de Slavoj Zizek  sobre Cognitivismo com Freud e alguns aspectos em que se fundamentam a educação cognitiva a partir da novidade.
Para Zizek, “O novo emerge determinado pela ligação de uma causa linear não completada, e esta, possibilita novas qualidades ou efeitos que transcendem o fato”. Aqui, paramos para uma questão: O ensino escolar para quem tem a vontade de aprender? É causa linear não completada atualmente? E o ensino escolar para todos, que inclui aqueles, que por diversas razões foram incluídos? Estes possibilitam novas qualidades ou efeitos que transcendem o espaço da escola?.  
De acordo com Zizek  as  “relações externas aos objetos apresentados, são emergidas por um conjunto de elementos formados pelos indivíduos que observam” Portanto, hoje com a Pedagogia da observação, a escola se transformou em reality onde todos são atores em meio de selfs e memes[1], produzindo vários comportamentos desregrados, isto é, as relações extraescolares determinam focos e metas em seu interior.
Desse modo, afirma Zizek: “É o elemento excessivo que define o percurso com sua visão de multitude, e estabelece o lugar das relações”  A complexidade das relações na escola faz com que todos os envolvidos tenham suas tarefas estendidas para além de suas funções e de forma tão hibrida, que perdem a noção sobre o que devem fazer a cada instante.
Zizek chama isso de “uma espécie de elemento zero ou pureza estrutural” Um exemplo na escola seria quando o professor percebe que está falando com as paredes ou está invisível para seus alunos. Para a sociedade Moderna e capitalista, este elemento zero possui segundo Zizek: “a função mediadora entre a experiência orgânica da velha sociedade de relações patriarcais e a nova relação moderna capitalista”.
Sendo esta nova relação moderna, aquela que deixa os educadores isolados em meio de tantos outros interesses de seus alunos, definido por Zizek como “O grande começo, o mediador ou catalizador, rejuvenescente do temperamento anímico entre os dois pontos de vistas (passado e moderno)”. Agora, perguntamos aos puros, para onde caminha a educação?
Se a escola se transformou no espaço das relações descomunais e se o excesso destas relações para Deleuze “é o lugar da liberdade e da reflexão, e que se sobrepõe à visão de causa linear, o caminho subjetivo para relatos, e as condições necessárias para assumir ou rejeitar o que está sendo apresentado”. Então, como diria Shrec diante da descoberta que sua princesa Fiona também era como ele: isso explica muito!
Se a escola tornou-se o espaço da liberdade e isto pode ser mais bem esclarecido na frase de Kant, que diz “Eu sou determinado por causas, mas posso escolher as causas que vão me determinar?”  Parece que a maioria dos indivíduos não tem muitas dúvidas e parece que seguem a frase do filósofo Demócrito, que afirmava “O que sei me basta”.
Outra preocupação levantada por Zizek, é que “somos passiveis de afetação dos elementos patológicos e da motivação, mas, num caminho reflexivo, temos um poder mínimo de aceitar ou rejeitar em ser afetado ou não”. Penso que os fatores patológicos estão vencendo a motivação no campo educacional. Mas, vamos continuar falando sobre liberdade de escolha.
Neste aspecto, de acordo com  Zizek, “o sujeito escolhe a causa que lhe determinará ou no mínimo, escolhe a determinação linear. Pois liberdade é inerente e relativa, não é um ato livre ou lugar nenhum´. Desse modo, a chamada liberdade é apenas mais uma abertura criada pela modernidade com fundamentação no excesso.
Para Zizek, a liberdade, “inicia uma nova causa (link), mas é um ato relativo, endossando uma sequencia ou link de necessidade que lhe determinará”. Quando o currículo nos diz: trabalhe o tema da aula com a necessidade do aluno. Então, temos a sensação de que entramos na toca do coelho branco, semelhante à atitude de Alice no País das Maravilhas.
Segundo Spinoza, “liberdade não é simplesmente reconhecer/conhecer necessidade, mas reconhecer/presumir as necessidades”. Sendo assim, presumimos que as necessidades de nossos alunos vão muito além daquilo que seria a função da escola. Qual é mesmo a necessidade da escola?
 Nas palavras de Spinoza, “a necessidade se constitui e se realiza através do reconhecer e do presumir” No entanto, reconhecemos o excesso de relações desregradas no espaço escolar, que de acordo com Zizek significa que “Este excesso de resultado sobre as causas, também significa  que o efeito é relativo a causa que este  causa – este temporal volta a estrutura mínima da vida”.
Concluindo, com o efeito do elemento zero mediando à educação,  estamos caminhando em circulo ou no ditado popular, como o cão que fica girando para morder o próprio rabo. Talvez, a resposta estaria no pensamento de  Kafka “cada escritor gera seus precursores. Seus trabalhos modificam suas concepções de passado, como também, modifica o futuro”.

Fonte:
KANT. Immanuel. Crítica da Razão Pura.  Coleção “Os Pensadores”  Nova Cultural. São Paulo, 1999.
ZIZEK, Slavoj. Organs Without Bodies On Deleuze and Consequences . Nova York, Routledge, 2004.




[1] Um meme, termo criado em 1976 por Richard Dawkins no seu bestseller O Gene Egoísta, é para a memória o análogo dogene na genética, a sua unidade mínima. É considerado como uma unidade de informação que se multiplica de cérebro em cérebro ou entre locais onde a informação é armazenada (como livros). No que diz respeito à sua funcionalidade, o meme é considerado uma unidade de evolução cultural que pode de alguma forma autopropagar-se. Os memes podem ser ideias ou partes de ideias, línguas, sons, desenhos, capacidades, valores estéticos e morais, ou qualquer outra coisa que possa ser aprendida facilmente e transmitida como unidade autônoma. O estudo dos modelos evolutivos da transferência de informação é conhecido como memética.

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

A cultura do vidro e do aço das grandes cidades segundo Walter Benjamin


Joaquim Luiz Nogueira 

Estamos vivendo numa época de grandes transformações advindas das tecnologias de guerra, mísseis inteligentes e guiados ou aviões invisíveis aos radares. E deste contexto de guerra, segundo Walter Benjamin, herdamos nossa experiência, chamada de moderna, logo após a Primeira Guerra Mundial.
Tal experiência de guerra ou de sobrevivência, que de acordo com Benjamim, ela atua como algo desmoralizante, já que as novas técnicas são acompanhadas por uma nova miséria, cuja  estruturação também se deu no inicio do século XX, junto aos conceitos da arquitetura moderna que trazia elementos como o vidro e o aço, a fantasmagoria e a galvanização.
Segundo  Benjamin, esses foram os novos conceitos da barbárie, feitos para direcionar os próprios bárbaros, no sentido de impedimento  que eles fossem adiante e obrigá-los a começar novamente suas vidas, ou seja, deviam contentar-se em construir seus projetos com pouco. Essas novas técnicas surgiram para transformar homens antigos em criaturas novas e com linguagens diferentes, mesmo que de forma arbitrária, porém decisiva e construtiva, contrastando com a dimensão da realidade orgânica.
A nova linguagem advinda das técnicas modernas se recusa a fazer semelhanças com os conceitos de humanidade e estão a serviço das transformações da realidade. Walter Benjamin, ao falar da cultura do vidro e  aço nas grandes cidades diz que se trata de materiais duros, lisos, frios, sombrios, sem aura e inimigos do mistério.
Essa nova arquitetura, segundo Benjamin, apaga os rastros do passado e força as pessoas para aquisição de novos hábitos  de ajustamento  e desapego dos objetos. Sendo assim, as novas experiências advindas desta cultura do vidro e do aço, leva os indivíduos às aspirações por libertação de todas as experiências anteriores a partir da ostentação da pobreza externa e interna.
As pessoas passam a consumir tudo o que está o seu alcance e isto as levam para o cansaço e a falta de iniciativa, o que, mesmo neste estado, ainda sonham quando dormem, diminuindo as tristezas e os desânimos, passam a crer em milagres, e que esses, posam ajudá-las a superar os contextos das novas técnicas.

Para Walter Benjamin, neste contexto, as pessoas fatigadas unificam-se em seus olhos: natureza e técnica, primitivismo e conforto. Dessa maneira, ficamos mais pobres para sobrevivermos a nova cultura, que ainda nos obriga a sorrir, ao abandono do patrimônio humano em nome do “atual”. Ela troca o Deus humano por um Deus bárbaro e neste sentido, obriga os indivíduos a se instalarem novamente, mas com poucos meios, sendo solidários e com aquisição de capacidades para renúncia.

Fonte da imagem:http:// construro.com/arquitetura 
Livro: Walter Benjamin / Obras Escolhidas/Magia e Técnica/ Arte e Política

terça-feira, 7 de outubro de 2014

UM HISTÓRICO DAS “COMPETÊNCIAS NA ESCOLA NA VISÃO DE DEMERVAL SAVIANI”



Joaquim Luiz Nogueira

Nascida em meio ao Pós-moderno e sob a influência dos computadores e seus espaços virtuais, cuja utilidade serviria para imaginar situações problemas e resolvê-las artificialmente. Esses projetos virtuais simulados em ciberespaços criavam modelos de eficácia, desempenho e competência, que segundo Saviani era “a lógica da ação positiva”.
Na década de 90, os interesses privados ganham força, pois são orientados pelas competências dos indivíduos em fazer escolhas, conhecido na época como “capital humano individual”. Aqueles que no computador iriam para a lixeira, na sociedade e na escola formavam uma categoria chamada de “excluídos e evadidos”.
Os “excluídos” foram orientados pelo mercado a buscar trabalhos por conta própria e a escola deveria deslocar seu eixo, como esclarece Saviani,  isto é, do processo educativo lógico para o psicológico, dos conteúdos para novos métodos centrados no aluno e não mais na disciplina.
Os excluídos que não foram selecionados pelo mercado, agora deveriam passar pela escola e o papel do professor não seria “ensinar para aprender algo ou assimilar conhecimentos, mas aprender a aprender”. A escola deveria demonstrar como se aprende a estudar ou buscar.
O aluno deveria buscar conhecimento por si mesmo, adaptar-se para ser empregável. Esta conduta levou a massa de excluídos a ganharem flexibilidade na invenção de novas operações simbólicas, o que podemos interpretar como uma nova compreensão do mundo.
             A nova compreensão de mundo dos excluídos os afasta da escola, e esta tem a  missão de fazer ajustes em nome do mercado, então temos o “Relatório da UNESCO em 1996 e os P.C. Nˢ”. Esses instrumentos, de acordo com Saviani, oferecem a base dos currículos no Brasil, que passam agora para uma política de inclusão de novas competências, ou seja, os novos saberes dos excluídos.
Para isso, a escola deve reconhecer novas relações entre conhecimento e trabalho, iniciativas e inovações. Nascem novas práticas educativas, definidas por Saviani como “características light”, cujas escolas  empresas, ONGˢ, sindicatos, religiões e academias deveriam adotar.
Com base nas teorias de Piaget, o ponto de partida das novas práticas da aprendizagem para atingir o conhecimento passa a ser “as ações”. Essas seriam responsáveis pelas conexões “sensório-motor”, isto é, para ligar as percepções aos movimentos, mesmo que sem representação ou finalidade.
A percepção e o movimento dos alunos estavam direcionados segundo esta teoria para conquista de fins práticos, por exemplo, bagunça na sala de aula. Esse movimento só trabalha com o que percebe, isto é, realidade interpretada como sinais, pois não são capazes de interpretar signos, símbolos, esquemas e conceitos mais complexos.
A saída da escola e da fonte do conhecimento, para incluir os excluídos nos anos 90, está na ação e nas relações professor/aluno. É o construir (construtivismo) que passa a orientar as práticas escolares. Os relatos dos alunos e professores ganham importância e suas narrativas cotidianas transformam-se em livros. É a ideia do que é vivido, ou seja, não organizado e não pensado, realidade do que é agora individual.
Voltamos à competência, emergida nos anos 60 como fruto do behaviorismo, identificada nesta fase inicial como objetivo que o aluno deveria atingir para realizar as operações, isto é, adquirir competências pela via cognitiva, segundo Saviani. ”Competência adquirida por esquemas construídos pelo sujeito e interação com o ambiente, equilíbrio e acomodação“.
Mas logo em seguida, a pedagogia da competência, rompe com esta interação do aluno com o seu meio (neoconstrutivismo) e passa a desprezar os conceitos de meio cultural-social do aluno, assim como os chamados conhecimentos prévios.
Descobre-se que as competências cognitivas ganham forças nas afetividades emocionais. Saviani afirma que a competência nesta fase funde-se com o “neopragmatismo”, então tornando “verdade elidida”, ou seja, veracidade suprimida. Elas podem ser adquiridas por mecanismos adaptativos do meio natural e social, ou seja, os alunos podem ser ajustados ao “processo produtivo”, mesmo que não estejam totalmente competentes.
Para formar trabalhadores e cidadãos, o conceito de qualificação, segundo Saviani, deveria ser guiado por “competências”. As escolas deveriam dar ênfase às competências no horizonte das disciplinas de conhecimento. O ensino das competências seria focado em determinadas situações, maximizado a eficiência para tornar os indivíduos mais produtivos no mercado de trabalho e mais participativos na sociedade. A ideia é que a produção aumente com o trabalho não pago, o que Saviani define como “criação de valor de troca ou obter o máximo com o mínimo”.
Aqui, vamos abrir parênteses para mostrarmos a fusão da: Pedagogias Tecnicistas de um lado - nela têm aquilo que de acordo com Saviani, os princípios de racionalidade e que nos anos 70, perseguia as iniciativas individuais com controle e direcionamento do Estado. De outro lado, a Pedagogia dos anos 90, que valoriza os mecanismos de mercado, com apoio da iniciativa privada, ONGˢ e parcerias público-privadas. Essa última, busca flexibilizar o processo; trata-se de uma inspiração que de  acordo com Saviani, seria do Toyotismo. E depois, o neotoyotismo, busca atualizar os professores, deslocando-os novamente do eixo de processo de aprendizagem para o de resultado.
O foco passa a ser a avaliação, sendo esta, encarregada de garantir eficiência e produção. Ela ganha o papel principal, a bola da vez, do Estado e da União. Alunos, escolas e professores devem ser avaliados a partir de resultados obtidos. As verbas, salários, recursos, tudo deve ser condicionado a resultados, produção e eficiência. É segundo Saviani, a busca da “qualidade total “ou “padrão FIFA da copa no Brasil”. Esse foco no resultado abre espaço no Brasil para penetração da Pedagogia Corporativa, que de acordo com Saviani é para atender a determinados nichos do mercado.
A pedagogia da “Qualidade  Total” defende a satisfação total do cliente e os funcionários devem vestir a camisa da empresa. A ideia é gerar competição entre os trabalhadores em torno do empenho pessoal com objetivos e metas. Os professores que ensinam são considerados, nesta teoria, como “prestadores de serviços”, os alunos tornam-se clientes, numa visão que a educação é um produto e que pode ser produzida com qualidade variável.
É a concepção da produção de diversos saberes ou diversidade, alunos diferentes com instituições diversificadas. Os clientes da escola são a comunidade e as empresas. Neste sentido, devem ficar satisfeitos. O professor, educador das novas gerações deve se transformar em treinador, isto é, para Saviani, a educação deixa de ser um trabalho de esclarecimentos e de conscientização para ser um trabalho de doutrinação, convencimento e treinamento para o mercado.
Trata-se de uma pedagogia que exclui os alunos e depois tenta incluí-los, definida por Acácia Kuenzer, como “exclusão includente”. Segundo Saviani, o trabalhador é primeiro excluído do trabalho formal e depois incluído na informalidade. Caso queira voltar para o emprego formal perderá vários direitos e sofrerá diminuição de salário.
Agora no lado educativo, ou educação voltada para o mercado, à estratégia para incluir os alunos nos “padrões de qualidade exigidos” nas empresas, e até para o nível idade série /ano, começa a ser feito com as metas da universalização do acesso, segundo Saviani. ”Essas crianças e jovens permanecem excluídos do mercado de trabalho e da participação ativa na vida da sociedade. Consuma-se, desse modo, a inclusão excludente”.
Concluindo, a escola democrática, reivindicada por docentes nos anos 80, tem a seguinte afirmação segundo “Saviani”:” Agora, o êxito da escola e da política educacional que orienta, depende apenas iniciativa e dedicação de vocês, professores”. Eis o drama atual do professor na visão de Saviani. Ele também é vítima da inclusão excludente.


Fonte: História das ideias pedagógicas no Brasil 
Demerval Saviani